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A delícia de viver no corpo a sua própria história

Reflexões sobre a insana busca por magreza e juventude para agradar aos outros

Atualizado em

Imagine a cena:  o ano é 2019.

Mulheres fazendo botox aos 40 anos. Mulheres enlouquecidas com criolipólise. Pomada para tirar manchas, pomada para tirar cicatriz, namastê, muai tai, vai para ginástica às 6h da manhã antes de levar o filho para a escola. Trabalha. E às 20h? Está bem linda para o maridão. Ou para as amigas. Ou para as tias. E pode ser que às 20h esteja apenas cansada em cima de uma cama à beira da depressão. Pode ser que não tenha ninguém para mostrar o corpão.

Falo hoje aqui sobre a síntese do mais importante movimento do feminino no agora para mudar toda essa esquizofrenia: amar teu corpo com tanta força e satisfação que ninguém possa dizer o contrário.

Pergunto: Por que você precisa desesperadamente apagar sua cicatriz? O que é essa moda bizarra das mulheres com 40 anos todas cheias de botox? Por que se encher de comprimidos e suplementos para atingir o nirvana biológico do super-homem ou da super-mulher? O que são esses maridos falando: “pô, você tem que se cuidar, olha essa gordurinha aqui…” “Nossa, emagreceu, tá se cuidando…” Como um marido, um pai, um homem pode falar do meu corpo como se a opinião dele, que eu não pedi, importasse?

Eu já falava sobre isso quando publiquei um texto nas minhas redes sociais ao ver a maravilhosa capa de fevereiro de 2019 da Revista Trip, trazendo a imagem de uma mulher de barriga de fora. Até aí, absolutamente nada de novo. O surpreendente foi a barriga estampada estar cheia de cicatrizes que a modelo ganhou após a gravidez. E na fala dela: “Por que não ter orgulho da cicatriz que trouxe o meu filho?”

Incendiada também pelo texto da querida escritora e roteirista e mãe e mulherão  Tati Bernardi, que já era genial e ficou ainda mais depois da maternidade, eu vim aqui te contar um segredo: o mais importante movimento feminino do agora é a ruptura radical com esse estético que faz vocês, amigas, ficarem pequenas. Aprisionadas, violentadas em busca de não sei o que. Porque não é por amor que corre essa caminhada. É a busca por suprir uma carência, uma falta emocional promovida pela nossa cultura.

Tudo isso se sabia, se falava, mas agora o movimento ganhou corpo.

O poder que existe no elogio a si mesma

Mulheres amigas ficam chocadas quando eu própria digo que me sinto e sei que estou linda. Hoje sou uma baita profissional, tenho uma vida que me faz plena e que ninguém vai ser melhor do que eu porque está mais “magrinha” ou porque está “se cuidando”. Tomando um monte de bola pra emagrecer? Isso é se cuidar? Queimando a gordura nesses aparelhos bizarros que congelam tua barriga pra afinar a cintura?

Aceita, honra, reverencia seu corpo. Ensina as outras a fazerem o mesmo. Abraça, finca o pé no chão e sente o poder e a tua fortaleza. A tua beleza.

Ninguém está acostumado a se elogiar porque foi ensinado que está errado. A mulher se autoelogiar é uma heresia. É prepotente. É arrogante. Mas vamos lá: olhe para minha casa. Olhe para minha carreira. Olhe para os meus filhos, para o meu casamento. Minha yoga, minha busca espiritual. Você tem mesmo certeza que falta algo pra mim, tendo engordado 20 quilos na gravidez, mas “ainda não ter voltado” para meu corpo antes de parir?

Mesmo que nada disso que enumerei existisse na minha vida, hoje mais do que nunca eu cuido de mim e da minha própria história. Como? Buscando uma ética e uma responsabilidade muito mais real do que essa moçada que está vivendo para ter um corpinho de “quem se cuida”. Ainda se enchendo de botox porque está difícil aprender a amadurecer.

Estar magra não é elogio

Já cansei de dizer: se quer me elogiar, não me chame de magra. Estar magra não é um elogio.

Estou linda, bem-sucedida, com uma família incrível e plena. Estou apenas feliz. E não vou te achar mais linda porque você emagreceu 5 quilos. Eu gosto de você, não do seu corpo.

Como jornalista de rádio, a quantidade de mulheres que amo e que nem mesmo conheço fisicamente, tô pra te contar. Me importa o peso ou a idade? Não. A única coisa que me importa é a conexão e a potência que vejo no outro. Em todas as áreas da minha vida.

É assim que esse manifesto termina: magra, gorda, com cicatriz, velha: que cada amada mulher que lê esse texto agora apenas pare de olhar para o corpo da outra e para o seu próprio corpo como uma moeda nessa competição esquizofrênica por alguém que te vê como um objeto inanimado. Aceita, honra, reverencia. Ensina as outras a fazerem o mesmo. Abraça, finca o pé no chão e sente o poder e a tua fortaleza. A tua beleza.

É muito bom estar viva nesses tempos de hoje. Feliz Dia Internacional da Mulher.

Foto: Unsplash

 

Petria Chaves

Petria Chaves

Jornalista e escritora. Em 2008, criou o pioneiro programa Caminhos Alternativos, na Rádio CBN. Na vanguarda dos programas espiritualistas e filosóficos da atualidade, pesquisou e levou ao público durante 9 anos informações sobre saúde, alimentação e qualidade de vida.

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