O que a sua ansiedade está querendo te dizer? (e quando buscar ajuda)
Entenda a ansiedade e saiba reconhecer quando é necessário buscar ajuda. Veja sinais, causas e caminhos de cuidado
Sabe aquele friozinho na barriga antes de uma prova importante? Ou aquela noite mal dormida antes da viagem tão esperada? Ou ainda o coração acelerado no encontro dos sonhos? Essa é a ansiedade, velha conhecida que insiste em não nos deixar relaxar. Mas o que a sua ansiedade está querendo te dizer?
Volta e meia lá está ela: cochichando no ouvido, cutucando o ombro e fazendo a gente roer as unhas de nervoso. Mas, antes de jogar pedra na Geni (ops, na ansiedade), você já parou para se perguntar o que ela está tentando te ensinar?
Ansiedade: entendendo as mensagens que ela traz
A ansiedade, em sua essência, não é um problema. Na verdade, é uma das emoções mais comuns do ser humano, desde que o mundo é mundo.
- Nossos ancestrais, que viviam entre predadores, não podiam ouvir um ruído no mato que já ligavam o sistema de luta ou fuga para sobreviver.
- Mesmo que não fosse nada, vovó já dizia: “É melhor prevenir, do que remediar”.
A ansiedade é como um sistema de alarme interno, sempre pronto para nos avisar de um perigo ou ameaça.
O grande X da questão é que nem tudo o que a nossa mente considera ameaçador realmente é.
E aqui vai um segredo importante: a mente mente. Sim, ela pode criar histórias, antecipar problemas, e nos fazer acreditar em cenários que não são reais.
Por isso, o objetivo deste artigo não é te ensinar como eliminar a ansiedade da sua vida – afinal, ela faz parte de nós –, mas sim entender o que acontece com a sua mente e como recalibrar esse alarme.
O que é a ansiedade?
A ansiedade é uma reação natural do corpo a situações desafiadoras ou perigosas. Tecnicamente, ela pode ser definida como um estado de humor negativo, caracterizado por sintomas físicos de tensão e apreensão.
Mas ao contrário do que muitos podem pensar, a ansiedade não é ruim. Na verdade, ela é essencial!
É ela que te faz estudar para a prova, se preparar para uma entrevista, ou olhar para os dois lados antes de atravessar a rua. É como se fosse um sistema de alarme do carro, que quando está calibrado te avisa de um perigo real ou ameaça iminente.
Mas, e se o seu alarme do carro disparasse toda vez que um passarinho pousasse no teto? Ou se você não pudesse nem encostar no veículo sem que ele fizesse um escândalo?
O problema da ansiedade surge justamente aí: quando o alarme está descalibrado.
Ansiedade normal x Ansiedade patológica
Ainda que nem toda ansiedade seja um problema, existe uma diferença importante entre a ansiedade normal e um transtorno de ansiedade, que precisa de tratamento.
Veja as diferenças:
- Ansiedade Normal: É o alarme funcionando direitinho. Aquela borboleta no estômago antes de uma apresentação, ou a preocupação com um prazo importante. São reações passageiras, proporcionais e que até te ajudam a ter foco e agir.
- Ansiedade Patológica (Transtorno de Ansiedade): É o alarme descalibrado, tocando o tempo todo, mesmo sem um perigo real. Sua mente e corpo entram em modo de ameaça constantemente, com “alarmes falsos” a cada esquina. Isso pode se manifestar como um medo extremo de interações sociais, ataques de pânico frequentes e sem motivo aparente, ou uma preocupação excessiva diária com várias coisas, a ponto de atrapalhar de verdade sua vida, trabalho, estudos ou relacionamentos.
É nesse ponto que precisamos escutar o que a sua ansiedade está querendo te dizer: ela não é mais apenas alerta, mas um sinal de que algo precisa ser cuidado.
Quais os sintomas da ansiedade?
A ansiedade pode afetar corpo, mente e comportamento:
- Físicos: coração acelerado, respiração curta, suor nas mãos, tensão muscular.
- Mentais: medo constante, preocupação exagerada, dificuldade de concentração.
- Comportamentais: insônia, irritabilidade, evitação de situações.
O que causa a ansiedade patológica?
Imagine que a ansiedade, quando vista de uma forma patológica, é como um quebra-cabeça complexo.
A Teoria da Tripla Vulnerabilidade nos ajuda a entender as três peças principais que podem fazer com que esse quebra-cabeça se encaixe e um transtorno de ansiedade apareça. Essas peças são:
- Vulnerabilidade Biológica Generalizada (A Herança da Sensibilidade)
- Vulnerabilidade Psicológica Generalizada (O Mundo é Assustador!)
- Vulnerabilidade Psicológica Específica (Medos Personalizados)

Vamos entender cada uma delas.
1. Vulnerabilidade Biológica Generalizada:
Pense nela como se você tivesse herdado um “sensor de perigo” mais sensível do que o normal. Algumas pessoas nascem com uma predisposição genética para serem mais tensas ou reativas ao estresse.
- Analogia: Imagine que você tem um alarme de carro que dispara mais facilmente do que o dos outros carros. Enquanto o alarme dos seus amigos só toca se alguém tentar arrombar o carro, o seu pode tocar com um vento forte ou um gato passando perto.
- Exemplo: Se seus pais ou avós são pessoas que se preocupam muito ou ficam facilmente ansiosas, é possível que você também tenha herdado essa tendência. Não é uma sentença, mas sim uma predisposição.
- Em resumo: É como se você já começasse o jogo da vida com um nível de alerta um pouco mais alto.
2. Vulnerabilidade Psicológica Generalizada
Essa peça tem a ver com as crenças que você desenvolve ao longo da vida sobre o mundo. Se você cresceu em um ambiente onde as coisas pareciam perigosas, imprevisíveis ou fora de controle, pode ter desenvolvido uma visão de mundo mais ansiosa.
- Analogia: Imagine que você está aprendendo a andar de bicicleta. Se você cai várias vezes e se machuca, pode começar a acreditar que andar de bicicleta é perigoso e que você não consegue controlar a situação.
- Exemplo: Se você cresceu em uma casa onde havia muita discussão, instabilidade financeira ou eventos imprevisíveis, pode ter desenvolvido a crença de que o mundo é um lugar inseguro e que você não tem controle sobre o que acontece.
- Em resumo: É como se você estivesse usando óculos que fazem com que tudo pareça mais ameaçador do que realmente é.
3. Vulnerabilidade Psicológica Específica
Essa peça do quebra-cabeça se refere a experiências específicas que te ensinaram que certas situações ou objetos são perigosos, mesmo que não sejam.
- Analogia: Imagine que você foi mordido por um cachorro quando era criança. Mesmo que a maioria dos cachorros seja amigável, você pode ter desenvolvido um medo irracional de todos os cachorros.
- Exemplo: Se você passou por uma situação humilhante em público, pode ter desenvolvido um medo intenso de falar em público, mesmo que não haja razão para acreditar que isso vai acontecer novamente.
- Em resumo: É como se você tivesse uma cicatriz emocional que te faz reagir de forma exagerada a certas situações.
Como essas peças se encaixam?
A teoria da tripla vulnerabilidade diz que a ansiedade se manifesta quando essas três peças se encaixam. Não basta ter apenas uma ou duas vulnerabilidades; é a combinação delas que aumenta significativamente o risco de desenvolver um transtorno de ansiedade.
- Exemplo: Uma pessoa com uma vulnerabilidade biológica (sensor de perigo sensível) que cresceu em um ambiente instável (mundo assustador) e passou por uma experiência traumática (medo personalizado) tem uma probabilidade muito maior de desenvolver ansiedade do que alguém que não possui essas vulnerabilidades.
Entender a teoria da tripla vulnerabilidade pode te ajudar a:
- Identificar suas próprias vulnerabilidades: Reconhecer suas predisposições biológicas, crenças e medos específicos.
- Buscar ajuda: Se você identificar que possui várias vulnerabilidades, procurar um profissional de saúde mental pode ser uma ótima ideia. Aqui também podemos trabalhar com a máxima de que prevenir é melhor do que remediar.
- Desenvolver estratégias de enfrentamento: Aprender a lidar com o estresse, desafiar crenças negativas e enfrentar seus medos de forma gradual.
Lembre-se: ter essas vulnerabilidades não significa que você está fadado a ter um transtorno de ansiedade. Com o conhecimento e as ferramentas certas, é possível controlar a ansiedade excessiva e viver uma vida plena e feliz.
Como a vida moderna desregula nosso alarme?
Quando falamos em ansiedade, é impossível não olhar para o mundo em que vivemos. Afinal, o ambiente em que estamos é um fator crucial para a nossa saúde, seja física ou mental.
Pense comigo: se vivemos em um lugar com ar puro, muita natureza e menos poluição, temos uma maior chance de ter uma saúde física melhor, certo?
Da mesma forma, um ambiente mentalmente mais leve e com menos exigências constantes tende a nos predispor a um menor nível de estresse e a uma menor propensão a desenvolver transtornos mentais.
E aqui reside um ponto de atenção enorme, especialmente para nós, brasileiros: o Brasil é o país com o maior número de pessoas com transtornos de ansiedade no mundo, segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS). Essa não é uma coincidência!
Nossa sociedade atual, com suas demandas incessantes, exige mais do que nunca de cada um de nós, e essa realidade tem um papel fundamental em reforçar as “mentiras” da ansiedade e descalibrar o nosso alarme interno.
O que prejudica a ansiedade?
É como se a nossa mente estivesse em um ambiente constantemente “poluído” por estímulos e pressões:
- Excesso de informação: Mal acordamos e já somos bombardeados por notícias, notificações e atualizações. Seu corpo e mente entram em modo de alerta antes mesmo de tomar o café da manhã, como se uma luta estivesse prestes a começar, o que eleva os níveis de cortisol (o hormônio do estresse).
- Redes Sociais e Comparação: A vida “perfeita” dos outros nas redes sociais nos leva a comparações injustas. A ansiedade adora essa armadilha, reforçando a necessidade de estar sempre bem, de se mostrar, e de se precaver contra um fracasso social que muitas vezes nem existe.
- Sociedade do Desempenho: A cobrança implacável para sermos perfeitos, produzir sem parar e ter sucesso em tudo nos leva à exaustão e, por consequência, à ansiedade. Sua ansiedade sussurra constantemente: “Você precisa fazer mais! Ser mais! Alcançar mais!”
- Multitarefas e Exaustão: Tentar fazer mil coisas ao mesmo tempo exige um esforço mental gigantesco. Sua mente e corpo ficam sobrecarregados, esgotados, e muito mais vulneráveis aos sinais de um alarme interno já desregulado.
É nesse ambiente de demandas, competição e hiperconexão que a ansiedade encontra um terreno fértil para prosperar, e é por isso que entender o que ela está te dizendo se torna ainda mais vital nos dias de hoje.
Leia também: Saúde Mental em tempos de métricas: o efeito psicológico de se sentir avaliado por números
Como lidar com a ansiedade?
Se você se identificou com algum dos sintomas ou situações descritas, saiba que é possível manejar a ansiedade. Existem atitudes que você pode tomar para regular o “alarme”:
- Converse: Fale sobre seus sentimentos com amigos, familiares ou profissionais.
- Cuide do Corpo: Pratique exercícios físicos, mantenha uma alimentação saudável e durma bem.
- Relaxe: Experimente meditação, yoga, respiração profunda ou mindfulness.
- Busque Ajuda: Se a ansiedade estiver atrapalhando sua vida, procure um psicólogo ou psiquiatra.
Lembre-se: pedir ajuda não é sinal de fraqueza, mas sim de coragem. Estou aqui se você precisar.
A ansiedade não é sua inimiga; ela é uma mensagem. Ao invés de lutar contra ela, o segredo é entender o que ela está querendo te dizer. Ouça seu corpo e sua mente, reconheça os sinais e, acima de tudo, priorize seu bem-estar.
FAQ (Perguntas Frequentes)
A ansiedade é sempre ruim?
Não. A ansiedade normal é uma reação natural e pode até nos ajudar a nos prepararmos para desafios. Apenas quando ela se torna excessiva e persistente, atrapalhando uma ou mais áreas da sua vida, causando sofrimento, é que se torna um problema.
Qual a principal diferença entre ansiedade e medo?
O medo é uma reação a uma ameaça que está acontecendo no momento (iminente). A ansiedade, por outro lado, é a antecipação de uma ameaça que ainda não aconteceu (futura).
Quando devo procurar ajuda profissional?
Você deve buscar um psicólogo ou psiquiatra quando a ansiedade for tão intensa que cause sofrimento e interfere em áreas importantes da sua vida, como trabalho, estudos ou relacionamentos. Um profissional pode ajudar a identificar a causa e a desenvolver estratégias eficazes.
Como faço para começar a “recalibrar meu alarme” no dia a dia?
O primeiro passo é a auto-observação. Comece a notar quando seu alarme toca:
- quais são os sintomas?
- o que você estava pensando antes (sua mente estava “mentindo” para você?)
- o que você fez em seguida (evitou a situação?).
Pequenas mudanças na forma como você responde a esses momentos – como focar na respiração ou questionar um pensamento catastrófico – já são um excelente começo para recalibrar seu sistema. Lembre-se, é um processo de prática diária, não uma solução instantânea.
Psicóloga clínica e pós-graduanda em psicopatologia. Oferece consultas de psicoterapia online no Personare.
Saiba mais sobre mim